O Ceará e o Hypercluster da Economia do Ar: Inovação, Inclusão e Soberania em um Cenário Global

Publicado 16:06 | 06 de nov de 2025

O mundo passa por uma transformação significativa, impulsionada por inovações tecnológicas e pela necessidade de soluções sustentáveis para os desafios ambientais, econômicos e sociais do século XXI.


Talvez, sempre ao citar o futuro e a ficção, Júlio Verne, em 1865, já escrevia “Da Terra à Lua”, citado por Neil Armstrong em sua chegada da Lua, 100 (cem) anos depois.


Nesse contexto, a “Economia do Ar” — do azul, espelho da “Economia do Mar” — se destaca como um motor de desenvolvimento global, unindo energia limpa, conectividade, agricultura inteligente, turismo de experiência, monitoramento ambiental, soberania tecnológica e, cada vez mais, justiça social e inclusão.


O Ceará, com seu céu azul, ventos constantes e sol intenso, poderá se posicionar como um protagonista nesse novo cenário, demonstrando como o potencial regional pode se alinhar com as tendências globais e oferecer oportunidades concretas para a redução de desigualdades históricas por meio da ciência.


No plano internacional, a Economia do Ar é impulsionada por uma nova corrida espacial, marcada pelo avanço das tecnologias de satélites, comunicação global, sensoriamento remoto, sistemas de navegação e redes de conectividade.


Empresas como a Starlink já operam mais de 6 mil satélites, ampliando o acesso à internet e a serviços em regiões antes desconectadas.


O domínio desses sistemas é vital para a competitividade econômica e possibilita inclusão digital, educação remota, segurança pública, telemedicina e acesso à informação — aspectos essenciais para a justiça social.


A busca por soberania tecnológica, exemplificada por sistemas como GPS, Galileo, Glonass e BeiDou, indica que o controle do espaço e das tecnologias associadas é também uma questão de equidade e autonomia para os povos.


No Brasil, a Agenda 2030 da ONU e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) orientam políticas públicas que visam não apenas ao crescimento econômico, mas à redução das desigualdades e à promoção da equidade.


A Agência Espacial Brasileira (AEB) tem desempenhado um papel importante ao fomentar a visão de satélites nacionais e regionais, utilizar tecnologia espacial para monitoramento ambiental e agricultura, e formar recursos humanos especializados. Isso democratiza oportunidades e amplia o acesso aos benefícios da inovação, especialmente para regiões mais vulneráveis. 


O Ceará exemplifica essa integração entre o global e o local. Sua localização privilegiada, favorecida pelos ventos alísios e clima seco, é uma vantagem para energias renováveis, observação astronômica, turismo e atividades aeroespaciais.


O estado destaca-se por ter uma forte matriz energética proveniente de fontes solar e eólica, na busca por sua liderança na geração de energia limpa e na sustentabilidade ambiental. Em 2025, 25 projetos de parques eólicos offshore, que representam 27% do total nacional, os investimentos ultrapassam para uma nova ordem.


No ano de 2024, o governo estadual investiu para fortalecer as redes elétricas e ampliar a geração solar, beneficiando 17 municípios e instalando sistemas fotovoltaicos em escolas públicas. Em 2025, quer ampliar ainda mais essa natureza destes investimentos. 


A inovação no Ceará vai além do setor energético. O Estado poderá estar no pioneirismo em tecnologias de monitoramento ambiental, haja vista a aquisição em 2022, de dois VANTs - Veículos Aéreos não tripulados da Alemanha, podendo também utilizar drones, sensores atmosféricos e, no futuro próximo, microssatélites para acompanhar desmatamento, detectar incêndios, mensurar a qualidade do ar e monitorar a biodiversidade e o crescimento urbano.


O monitoramento do bioma caatinga — especialmente em áreas sob risco de desertificação — e do bioma marinho, com seus recifes e zonas costeiras, destaca-se como exemplo de como ciência, tecnologia e políticas públicas podem convergir para proteger o patrimônio natural e promover o uso sustentável dos recursos.


Parcerias com universidades, centros de pesquisa, como o ITA, startups e a AEB, potencializam soluções inovadoras, como sistemas de alerta precoce e análise preditiva, fundamentais para enfrentar as mudanças climáticas e preservar o meio ambiente.


O turismo, um pilar fundamental da economia cearense, é diretamente beneficiado pela Economia do Ar.


O Estado investe, no hub aéreo, na ampliação das rotas aéreas e na modernização de aeroportos regionais, consolidando-se como um dos principais destinos turísticos do Brasil.


Durante a alta estação, companhias como Latam e Gol aumentam suas operações, elevando a frequência de voos entre Fortaleza e São Paulo, além de conexões diretas com Salvador, Manaus e Buenos Aires.


Fortaleza, reconhecida mundialmente por sua qualidade do ar e temperatura estável, conforme estudo da Oxford de 2024 que coloca a cidade em 2º lugar entre as 1000 cidades mais desenvolvidas, se torna um hub internacional, registrando crescimento no número de turistas estrangeiros e recebendo voos diretos de cidades como, Miami, Orlando, Lisboa, Santiago, Madri e Paris.


Essa expansão impulsiona o turismo de experiência, ecoturismo, esportes radicais - como kitesurf, windsurf, wing foil, e outros - e observação astronômica, tornando o Ceará um polo que alia recursos naturais, infraestrutura moderna e excelência ambiental.


O turismo científico, de base comunitária e o intercâmbio cultural ampliam oportunidades para jovens, mulheres e comunidades tradicionais, promovendo inclusão e geração de empregos.


A agricultura cearense, tradicionalmente resiliente às adversidades climáticas, passa por uma revolução para a adoção de drones agrícolas, sensores inteligentes e sistemas de análise de dados por satélite.


O monitoramento climático em tempo real, mapeamento de áreas de risco, irrigação inteligente e detecção de pragas e doenças permitem ganhos de produtividade, eficiência e sustentabilidade - o caminhar no olhar do não agrotóxico. 


A dimensão educacional e tecnológica do Ceará atinge um novo patamar com o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), fundado em 1950 por Casimiro Montenegro Filho, um cearense ilustre.


O ITA formou gerações de engenheiros e cientistas, muitos inclusive cearenses, que têm contribuído para o desenvolvimento de micro e nano satélites, sistemas de monitoramento, defesa e telecomunicações.


Em 2013, o Estado recebeu um polo do Mestrado Profissional do ITA em Fortaleza. Em 2024, foi anunciada a criação da primeira unidade permanente do ITA fora de São José dos Campos (SP), a ser instalada em Fortaleza com início das atividades previsto para o segundo semestre de 2025.


Essa conquista representa uma oportunidade estratégica para consolidar o Ceará como referência em economia aeroespacial, robótica, inteligência artificial e energias renováveis, estimulando pesquisa, geração de startups e internacionalização do conhecimento produzido no estado.


Destaca-se também o potencial de parcerias com a Embraer, cuja história tem ligação especial com o Ceará. Nos anos 1990, o fundo de pensão do Banco do Nordeste (BNB) converteu debêntures em ações, chegando a deter 37% do capital da empresa, fundamental para sua reestruturação.


A colaboração entre ITA e Embraer é um exemplo nacional de inovação aeronáutica.


Com a expansão do ITA em Fortaleza, poderá surgir a possibilidade de instalação de uma base de operações ou centro de engenharia da Embraer no Ceará, fomentando a indústria local de aviação, capacitação técnica e desenvolvimento de novas tecnologias aeroespaciais, especialmente em micro e nano satélites.


Outro vetor de oportunidades é a transição global para combustíveis sustentáveis. O Ceará já se posiciona como protagonista na agenda do hidrogênio de baixo carbono, aproveitando seu potencial eólico e solar para atrair investimentos e parcerias estratégicas, no H2V.


O Pecém Innovation Center(PIC), no Porto do Pecém, deverá ser um polo de pesquisa e desenvolvimento, plantas pilotos e berço de um parque, que poderá agregar iniciativas para o desenvolvimento do SAF (Sustainable Aviation Fuel).


Companhias aéreas como Gol e Latam, além da operadora de aeroportos Fraport, que mantém relações com Lufthansa e Condor, têm potencial para integrar essa iniciativa em uma cadeia produtiva inovadora e internacionalizada, promovendo a descarbonização da aviação, atraindo investimentos externos e consolidando o Ceará como um hub de inovação sustentável para o setor no PIC.


No futuro, a busca por uma base de lançamento de microssatélites no Ceará poderá aproveitar a localização estratégica, infraestrutura aérea e tradição de ousadia científica, podendo transformar o Estado em eixo de inclusão digital, dentro do vetor aeroespacial, com conectividade e desenvolvimento sustentável para todo o Nordeste, tornando-se referência nacional e internacional.


O alinhamento entre ITA, Embraer, AEB, Pecém Innovation Center, governo estadual, universidades e setor privado cria um ambiente fértil para startups, aceleração de projetos inovadores e promoção de uma cultura empreendedora nessa indústria.


A integração de políticas públicas, incentivos fiscais, investimentos em infraestrutura, educação e capacitação, associada ao uso responsável e inovador da tecnologia, impulsiona não apenas a economia limpa, mas também a diversificação produtiva, a inclusão social e a redução das desigualdades regionais.


O Ceará, ao alinhar-se às melhores práticas globais de sustentabilidade, pesquisa aeroespacial e inovação, poderá tornar-se referência para o Brasil e para o mundo, inspirando novas gerações a construir um futuro mais justo, seguro e próspero.


A Economia do Ar no Ceará é mais do que uma estratégia de desenvolvimento: é uma síntese do potencial de um povo que transforma o céu azul, os ventos constantes e o sol intenso em motores de progresso.


É a afirmação de uma identidade inovadora, resiliente e aberta ao mundo, pronta para ser um dos líderes no Brasil na nova era global da sustentabilidade, ciência e tecnologia.


O compromisso com a preservação ambiental e a busca por soluções inovadoras garantem que o desenvolvimento econômico seja acompanhado de responsabilidade social, respeito ao meio ambiente e valorização das futuras gerações.


Ao olhar para o futuro, a Estratégia da Economia do Ar oferece ao Ceará a possibilidade real de reduzir os hiatos históricos de oportunidades, promovendo justiça social e inclusão.


Enfim, o Ceará reafirma sua vocação para o futuro, tornando-se símbolo de uma sociedade sustentável, próspera e alinhada com as melhores oportunidades do século XXI, no qual  a inovação serve como ponte para a equidade.


Celio Fernando Bezerra Melo, economista e consultor econômico do Anuário do Ceará