O torcedor cearense tem se acostumado a ver seus dois principais clubes, Ceará e Fortaleza, disputando com frequência as maiores competições do Brasil e da América do Sul.
O destaque de ambos dentro de campo é reflexo direto de uma profissionalização consolidada ao longo dos últimos anos, com uma gestão mais moderna e estruturada.
Para quem acompanhou de perto o processo, o salto é evidente de 10 ou 15 anos para cá.
Já para quem ficou à margem, talvez não seja simples compreender a verdadeira revolução que ocorreu. Um olhar para o passado recente ajuda a dimensionar essa transformação.
Em 2012, por exemplo, o Ceará acabara de ser rebaixado para a Série B, mesmo com o clube já apresentando sinais de recuperação financeira sob o comando de Evandro Leitão.
A estrutura ainda era bastante limitada — nem mesmo um centro de treinamento exclusivo para as categorias de base existia.
No mesmo período, o Fortaleza amargava a Série C, onde permaneceria até 2017, enfrentando grande instabilidade administrativa, com diversas trocas de comando.
Dependente de figuras que atuavam como mecenas para manter as contas equilibradas, o clube recorria a campanhas de marketing criativas para impulsionar a venda de produtos e engajar a torcida.
Sem a Copa do Nordeste — que seria retomada apenas em 2013 —, o Campeonato Cearense tinha ainda mais relevância, servindo de principal objetivo da temporada e como via de acesso à Copa do Brasil, uma vez que os rankings de ambos os clubes não garantiam vagas diretas.
Comparado ao cenário atual, o contraste é impressionante. A virada começou com mudanças profundas na forma de administrar.
No Ceará, a chegada de Robinson de Castro à presidência, em 2015, trouxe uma visão empresarial ao clube.
Já no Fortaleza, Marcelo Paz, desde 2018 à frente do futebol, implantou uma cultura de planejamento rigoroso e metas claras. Ambos passaram a tratar os clubes como organizações profissionais, priorizando o equilíbrio financeiro, a redução de dívidas e a credibilidade no mercado.
Hoje, Ceará e Fortaleza competem com clubes tradicionais do futebol brasileiro por jogadores e estrutura, mesmo sem os recursos de grandes investidores que têm colocado muito dinheiro em times como Bahia, Botafogo, Vasco e Cruzeiro.
O Ceará, que enfrentou dificuldades com o rebaixamento em 2022 e a permanência na Série B em 2023 e 2024, conseguiu se reerguer, retornou à elite nacional em 2025, investiu em processos e pessoas e foi bicampeão cearense nos dois últimos anos, demonstrando força para voltar a competir em alto nível.
O Fortaleza, por sua vez, mantém sua presença constante na Série A desde 2019, recorde absoluto entre os clubes nordestinos, acumula boas campanhas, foi vice-campeão da Copa Sul-Americana e, em 2025, novamente está na Libertadores da América.
A SAF foi formalizada, ainda sem aporte financeiro, e o clube segue crescendo de forma sustentável, com um trabalho reconhecido no País.
Também é digno de nota o investimento nas categorias de base e na estrutura física dos clubes. O Ceará concluiu a compra da Cidade Vozão, enquanto o Fortaleza reformulou e modernizou o CT Ribamar Bezerra.
Ambos mantêm equipes de transição e captam jovens talentos com mais organização. A utilização de tecnologia e dados é outra realidade, com ferramentas modernas de análise, preparação física e recuperação sendo aplicadas no dia a dia.
Fora de campo, o vínculo com o torcedor se fortaleceu. São aproximadamente 80 mil sócios, somando os dois clubes, com espaço para um crescimento ainda maior.
Produtos licenciados, marketing digital e engajamento nas redes sociais se tornaram parte do cotidiano, gerando receitas e visibilidade que atraem patrocinadores.
Com essa engrenagem funcionando, o futebol dentro das quatro linhas tende a acompanhar, sem perder de vista que o trabalho responsável é dinâmico, tanto para a manutenção do bom momento quanto para a busca por evolução.
Qualquer vacilo, e a queda vira realidade. Já fora de campo, o ecossistema esportivo é parte relevante da economia, construindo emprego e renda nos mais variados setores da sociedade.
O Fortaleza vive o período mais consistente de sua história e tem como meta a permanência na Série A, além de desempenhos competitivos em todas as frentes. O Ceará, de volta à elite, também precisa focar na permanência e na conquista de uma vaga em competições internacionais. Afinal, embora o futebol seja imprevisível, os resultados não surgem por acaso — eles são construídos com trabalho ativo, estratégia e visão de longo prazo.
Fernando Graziani - Âncora da Rádio O POVO CBN e colunista do O POVO